Camisa 10 e com faro de artilheiro, Zico comanda o Tigre de Abunã rumo
ao título. Não, não estamos falando da volta aos campos do maior ídolo
da história do Flamengo. É que lá no Norte do Brasil há um homônimo do
Galinho de Quintino que faz sucesso no Plácido de Castro, clube que se
tornou profissional há apenas quatro anos, foi vice-campeão do Acre em
2011 e faz boa campanha na Série D do Brasileirão.
Zico, o de Plácido, é Edivaldo Neri da Silva - por coincidência, xará
de Dida, outro ídolo do Fla - e do Zico original -, nos anos 50 e 60.
Tem 36 anos, já se ausentou de um jogo na Série D por conta de uma lesão
no joelho esquerdo, mas garante que a aposentadoria está longe.
Artilheiro do Campeonato Acreano em 2008, ele fez oito gols em 2011,
apenas três a menos que os artilheiros Jô e Nilton Goiano. Motivação
para continuar nos gramados é o que não falta.
- A gente vê que o pessoal hoje em dia cansa rápido, rapaz. Não tenho
uma data predefinida, não. Ano que vem, jogo tranquilo. Faço isso mais
para ajudar o município - disse.
Zico (dir.) fez oito gols no Campeonato Acreano deste ano (Foto: Divulgação/Victor Augusto)
E faz mesmo. Zico tem emprego fixo na Secretaria de Obras do município,
que tem o mesmo nome do time. Ele é eletricista e joga no time para dar
mais experiência à equipe. Poderia aceitar propostas de outras equipes
da região, mas prefere ficar na cidade onde nasceu.
Zico faz o que pode para ajudar. Mas, com nome de um craque do futebol
brasileiro, muitas vezes passa por cobranças indevidas dentro de campo.
- Às vezes fica até chato, fazem comparação. Querem ver em campo o Zico, né? Mas nada que atrapalhasse de verdade até hoje.
O apelido veio quando Zico era mais novo. Um instrutor de colônia de
férias disse que ele lembrava o jogador do Flamengo jogando futebol. Só
que o posicionamento em campo sempre foi diferente. Zico, o menos
famoso, nasceu e cresceu centroavante, embora também vestisse a 10, como
o xará.
- Assim como todos os atacantes da minha época, eu me espelhava mesmo
era no Romário. Era um cara de área, assim como eu - justificou,
deixando claro que é rubro-negro e que Zico também é seu ídolo.
Série D, de dureza
Para ser o Romário do Plácido de Castro, Zico passa por poucas e boas.
Para enfrentar o Vila Aurora-MT, pela segunda rodada da Série D, o
Plácido, entre trechos de ônibus e avião, levou 11 horas para chegar a
Rondonópolis. Pela distância e dificuldade em encontrar voos, a
delegação teve que ficar cinco dias em Mato Grosso. Foram R$ 35 mil de
gastos em apenas uma rodada para um clube que tem folha salarial de R$
65 mil e treina em um campo de um vilarejo onde moram cerca de 20
famílias.
Campo de treino do Plácido (Foto: assessoria de
comunicação da Prefeitura de Plácido de Castro)
No caminho entre Rondonópolis e Cuiabá, na volta, uma recompensa:
paradinha no município de Jaciara para um banho na Cachoeira da Fumaça,
algo inédito para muitos dos jogadores.
- A maioria nunca tinha ido a uma cachoeira, não conhecia. Foi um
momento muito legal - recordou o diretor de futebol, Beto Faustino, um
dos responsáveis por coordenar toda a delegação.
Na semana retrasada, outra via-crúcis. O Plácido de Castro viajou para
Rio Preto da Eva, no Amazonas. Era o meio do caminho entre Itacoatiara e
Manaus, onde o time tinha dois jogos, contra o Penarol e o Nacional.
Para evitar gastos, a diretoria decidiu ficar mais de uma semana no
estado vizinho.
No primeiro jogo, derrota por 2 a 0 para o Penarol, pela quinta rodada.
No segundo, outra derrota por 2 a 0, desta vez para o Nacional, na
sexta. O Plácido, então líder, caiu para terceiro lugar, com sete pontos
ganhos, três a menos que o Penarol e dois atrás do Cuiabá. Apenas os
dois melhores passam de fase.
Zico, com a tal lesão no joelho, só entrou no segundo tempo do dois
jogos e não conseguiu evitar as derrotas. Vai voltar aos poucos e, quem
sabe, ajudar o time a conquistar a sonhada vaga para a Terceirona. Dos
três jogos que faltam para o time acreano, dois são em casa.
- O time sempre acreditou, só que o pessoal aqui da região estava meio
desacreditado. Mas, pelo que vi até agora, acho que vamos conseguir.
Depois desta fase de grupos, só precisamos de mais dois mata-matas para
chegar à Série C. Acredito que o time está bem encaminhado - disse Zico.
Plácido de Castro: revolucionário, presidente, município e time de futebol
O time de Plácido de Castro é homônimo do município de origem, que por
sua vez carrega o nome de um dos personagens mais importantes da
história do Acre. Gaúcho de São Gabriel, Plácido era militar no Rio
Grande do Sul, até ter divergências políticas locais e se mudar para o
Rio de Janeiro. Na capital fluminense, se tornou agrimensor e decidiu
tentar o sucesso na carreira morando no Acre.
Cena da emboscada a Plácido de Castro no Parque Municipal (Foto: Edison Caetano/Futura Press )
Na época, o Acre pertencia à Bolívia, mas por lá moravam muitos
brasileiros devido ao ciclo da borracha. Por conta disso, o Brasil e o
país vizinho disputaram o território. Plácido de Castro estava
demarcando o seringal Victoria na época, soube de um possível acordo
entre bolivianos e os Estados Unidos, e passou a comandar seringueiros
contra tropas rivais.
Em 1902, comandando uma revolução com cerca de 30 mil homens, Plácido
derrotou o último foco de resistência boliviana e proclamou a
Independência do Acre, onde passou a ser presidente. Em 1903, em uma
negociação diplomática para evitar novos confrontos, o Brasil pagou à
Bolívia a quantia de 2 milhões de libras esterlinas e incorporou o
território.
As intrigas políticas na região, entretanto, não acabaram, e Plácido
foi vítima de uma emboscada em 1908 e morreu. O município com o seu nome
foi criado em 1976. O clube surgiu três anos depois, mas apenas para
jogos de pelada. A profissionalização deu-se em 2008, e o time de Zico
conseguiu o melhor resultado em 2011, com o vice-campeonato estadual.
fonte:globo esporte.com